Marcelo Slaviero - Set 15

Panos novos, vestidos velhos

Por Tullio Damin da Sois

Não faz muito tempo que veio à tona a criação de uma iniciativa partidária por parte do PCdoB, o Partido Comunista do Brasil, a qual se chamaria Movimento 65. Com uma identidade visual dando destaque ao verde e amarelo e reduzindo ao máximo a presença da cor vermelha, a cor do comunismo e da identidade visual histórica do partido, especulou-se muito na imprensa e nos meios políticos sobre uma alteração de nome e identidade do PCdoB.

A especulação estava equivocada, mas o motivo da mesma é compreensível: o princípio da iniciativa dos comunistas é o mesmo pelo qual recentemente diversos partidos políticos optaram por alterar seus nomes e identidades. Vejamos o por que dessa confusão e o que está por trás de todo esse movimento de “novas embalagens” na política brasileira.

O tal do Movimento 65 é, na verdade, uma iniciativa do PCdoB para a atração e formação de lideranças políticas alinhadas às suas pautas e ideias. A estratégia é a seguinte: foram criados dois movimentos, o Movimento dos Comuns e o Movimento 65. O primeiro possui um caráter não necessariamente partidário, buscando atrair lideranças de movimentos sociais e pessoas em geral contrárias à administração do Governo Federal de Jair Messias Bolsonaro, com o objetivo de apresentar a elas as ideias e plataformas políticas do partido. Então, aqueles que se identificarem com o perfil do PCdoB e quiserem se candidatar a cargos políticos passam a integrar o segundo movimento, que tem como objetivo a conquista do maior número possível de legislaturas e prefeituras nas Eleições Municipais de 2020 – também se fortalecendo, é claro, para as eleições seguintes.

E é daí que surge o questionamento: sendo o PCdoB um partido político bem estabelecido, de longa data e presença nacional, por que optaram as suas lideranças pelo lançamento de “movimentos” com uma identidade visual fortemente alterada e praticamente desprovida de referências às cores e símbolos do Comunismo? A resposta dos organizadores do Movimento 65 é de que o termo “Comunismo” foi muito desgastado nos últimos anos, e é por isso que se faz necessária a utilização de termos mais palatáveis à população em geral – afinal de contas, o partido quer atrair, e não afastar, novos apoiadores e filiados.

No caso específico do PCdoB, o motivo dessa iniciativa é contornar o desgaste nos anos recentes da esquerda brasileira, e em especial dos apoiadores do Comunismo, por conta dos inúmeros escândalos de corrupção dos governos petistas. Mas, como inicialmente mencionado, esse é somente mais um caso de tentativa de afastamento da imagem negativa que a política possui no imaginário popular brasileiro dentre os partidos políticos do país.

A lista de alterações nos últimos anos é extensa: o Partido do Movimento Democrático Brasileiro, o PMDB, virou só MDB; o Partido Trabalhista Nacional (PTN) e o Partido Trabalhista do Brasil (PTdoB) são agora Podemos e Avante, respectivamente; o Partido Progressista (PP), antes Partido Democrático Social (PDS), virou somente Progressistas; o Partido Ecológico Nacional (PEN) é agora o Patriota; o antigo Partido Social Democrata Cristão (PSDC) se tornou a Democracia Cristã; e o Partido Republicano Brasileiro (PRB) e o antigo Partido Popular Socialista (PPS) agora são somente Republicanos e Cidadania, respectivamente. O atual Democratas já foi conhecido como o antigo Partido da Frente Liberal (PFL), e é o único caso de alteração de nomenclatura mais precoce – ainda em 2007. Por fim, há somente um caso atípico de mudança, no qual o termo “partido” foi mantido no nome da agremiação: o do antigo Partido da República (PR), resultado da fusão entre o Partido Liberal (PL) e o Partido da Reedificação da Ordem nacional (PRONA), e que recentemente voltou a se chamar Partido Liberal (PL) – provavelmente uma tentativa de surfar a onda de ascendência das ideias conservadoras e liberais no país.

Ao que tudo indica, o motivo por trás dessa vasta lista de alterações partidárias é basicamente o mesmo: a crise de representatividade dos partidos políticos brasileiros em relação à população do país. Não é de hoje que grande parte da população brasileira possui um nível elevado de desconfiança com relação à política brasileira e, portanto, com seus representantes e organizações também. Adicione-se a isso a continuidade – e o nível cada vez mais escandaloso – das revelações de esquemas de corrupção que se espalhavam e ainda se espalham por todas as entranhas do poder público do Brasil, e fica extremamente fácil de se entender a crescente insatisfação da população com a esfera política brasileira.

No caso específico dos partidos, pode-se argumentar o seguinte: tradicionalmente, a maior parte dos partidos políticos brasileiros trazia, e ainda traz, em seus nomes termos que indicam o seu posicionamento político, que condensam as suas posições ideológicas e os seus programas partidários. E isso obviamente implica na presença do termo “partido” na nomenclatura de tais agremiações, como forma de firmar o caráter político de seus posicionamentos.

Há uma associação direta e natural, portanto, da palavra “partido” com a política. E é exatamente com o intuito de se distanciar e desvincular-se da imagem negativa e desgastada da política que está presente no imaginário popular brasileiro que tal alteração de nomenclatura virou moda entre os partidos políticos brasileiros. E a forma pela qual isso é feito normalmente se dá pela escolha de termos mais genéricos, de conotação mais positiva e pouco desgastada, que aparentemente são mais palatáveis à população em geral.

Então, não se engane: tais mudanças são muito mais uma jogada de marketing, uma mera mudança de fachada por parte dos partidos, do que uma sinalização de que as práticas políticas serão mudadas. A verdadeira – e tão necessária – renovação política brasileira não passa por fazer remendos de panos novos em vestidos velhos. E quem também acha que somente rostos novos resolvem o problema também entra em um equívoco. A verdadeira renovação política passa por novas práticas: pelo compromisso com o eleitor e com o pagador de impostos; pela coerência entre o discurso e a prática.

E não é nada difícil saber onde encontrar uma boa dose dessa tão almejada coerência...

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